Controlar o próprio dinheiro é mais importante do que ganhar mais? Segundo Zun, uma mãe japonesa de quatro filhos, a resposta é sim. Para ela, gerenciar com sabedoria os recursos que já estão disponíveis é o segredo para uma vida equilibrada e divertida. Zun, há 12 anos, pratica o método “kakebo”, uma técnica japonesa de controle financeiro criada em 1904. Simples, eficaz e acessível, o kakebo só exige papel, caneta e persistência — e, mesmo em tempos de alta tecnologia, ainda conquista adeptos ao redor do mundo.
O kakebo foi criado por Hani Motoko, a primeira mulher jornalista no Japão, com o objetivo de ajudar as donas de casa a gerirem de forma eficiente os orçamentos domésticos. Em uma sociedade onde as mulheres tinham pouco controle sobre as finanças, o kakebo proporcionava uma sensação de independência e poder de decisão, especialmente em tempos de incerteza econômica. Embora o método tenha sido desenvolvido há mais de um século, ele ainda é uma ferramenta muito útil em um mundo moderno marcado por consumismo e dívidas.
A popularidade do kakebo não se limita ao Japão. Atualmente, o método ganhou o mundo, especialmente em um cenário onde muitas pessoas buscam formas de gerenciar melhor seus orçamentos domésticos, diante de crises econômicas globais, aumento do custo de vida e incertezas financeiras exacerbadas pela pandemia de COVID-19. Segundo a consultora financeira Harumi Maruyama, o kakebo pode ser um divisor de águas para aqueles que tentam manter suas finanças sob controle. “Mesmo com um orçamento apertado, o kakebo ajuda as pessoas a evitarem gastos excessivos e a criarem uma reserva financeira”, afirma.
O princípio básico do kakebo é a simplicidade e diferente de muitos aplicativos de finanças que automatizam os registros, o método tradicional exige que o usuário escreva manualmente suas entradas e saídas de dinheiro, divididas em categorias como: despesas essenciais (moradia, alimentação, transporte), lazer (entretenimento, compras, restaurantes) e gastos imprevistos (reparos, emergências). Segundo Zun, essa abordagem prática facilita a reflexão sobre o que realmente está sendo gasto e permite maior controle. “Escrever com a mão ajuda a processar a informação de maneira mais consciente. Te força a encarar seus hábitos de consumo”, diz ela.
Para aqueles que estão dispostos a experimentar o método, Maruyama sugere um teste de três meses. “A partir desse período, você começa a ver resultados. O kakebo exige compromisso, mas oferece uma visão clara de como seu dinheiro é gasto”, explica. O método também incentiva os usuários a refletirem sobre quatro perguntas essenciais ao final de cada mês: Quanto você conseguiu poupar? Quanto gostaria de ter guardado? Quanto efetivamente gastou? O que pode mudar para melhorar no próximo mês? Esse processo de autoavaliação é o que diferencia o kakebo de outros métodos de orçamento.
Enquanto muitos sistemas focam em regras rígidas e cortes imediatos de gastos, o kakebo se concentra em fazer ajustes conscientes e em gastar “bem”. A ideia não é evitar o prazer, mas aprender a administrar o dinheiro de forma que sobre para o que realmente importa. A própria Zun compartilha sua experiência pessoal, relatando que, ao revisar suas anotações, percebeu que poderia ter economizado em várias pequenas compras para adquirir algo que realmente queria, mas que inicialmente parecia muito caro.
Embora a era digital tenha introduzido aplicativos de controle financeiro com funções automatizadas, muitos japoneses — e agora pessoas ao redor do mundo — continuam preferindo o formato tradicional do kakebo. O ato de escrever manualmente, em vez de usar aplicativos digitais, permite uma conexão mais consciente com o dinheiro. “Há uma diferença psicológica quando você vê fisicamente o seu dinheiro diminuindo ao pagar em dinheiro vivo”, acrescenta Maruyama, apontando que esse impacto visual pode frear impulsos consumistas.
Nos dias de hoje, onde muitos vivem em uma constante corrida por melhores salários e mais oportunidades de renda, o kakebo oferece um lembrete valioso: o dinheiro que você ganha só fará diferença se for bem administrado. Com a inflação alta e a volatilidade dos mercados, saber gastar pode ser a chave para a estabilidade financeira. Uma pesquisa recente realizada pela Deloitte apontou que 43% das pessoas entrevistadas consideram a educação financeira como essencial para uma vida equilibrada, e o kakebo é uma das ferramentas que pode contribuir para isso.
Em meio a essa realidade, o sucesso contínuo do kakebo não é surpreendente. Cada vez mais pessoas buscam alternativas simples e eficientes para se libertarem das dívidas e conquistarem uma vida financeira mais saudável. No Brasil, a educação financeira tem ganhado força, com mais pessoas interessadas em métodos como o kakebo para equilibrar as finanças. Livros sobre o método, como o de Fumiko Chiba, “Kakebo: A arte japonesa de poupar dinheiro”, têm ganhado popularidade nas prateleiras brasileiras, especialmente entre aqueles que preferem um controle financeiro menos dependente da tecnologia.
O que o futuro reserva para o kakebo? Com a crescente conscientização sobre a importância do planejamento financeiro pessoal, é provável que o método continue a ganhar adeptos ao redor do mundo, provando que, apesar dos avanços tecnológicos, o poder da caneta e do papel ainda pode ter um impacto profundo nas nossas vidas financeiras.